Em julgamento de recursos especiais repetitivos (Tema 1.024), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a tese de que a ausência de profissional de enfermagem na tripulação das ambulâncias de suporte básico do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) não viola a Lei 7.498/1986, que regulamenta o exercício da enfermagem.
Segundo o relator, ministro Og Fernandes, a exigência desses profissionais na tripulação poderia "prejudicar o sistema de saúde, pois esses veículos – que compõem a maioria da frota – não poderiam circular sem a contratação de milhares de enfermeiros em todos os rincões do país".
A tese jurídica firmada por unanimidade foi a seguinte: "A composição da tripulação das Ambulâncias de Suporte Básico – tipo B – e das Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência – Samu sem a presença de profissional da enfermagem não ofende, mas sim concretiza, o que dispõem os artigos 11, 12, 13 e 15 da Lei 7.498/1986, que regulamenta o exercício da enfermagem".
Portarias O ministro Og Fernandes explicou que, apesar de não haver precedentes no STJ, existem posições opostas nos Tribunais Regionais Federais sobre o assunto, o que obriga a corte a exercer sua função de uniformizar a interpretação da lei federal, evitando que prossigam as controvérsias sobre matéria de tão grande repercussão no cotidiano da população brasileira.
Para regular o serviço oferecido pelo Samu, o Ministério da Saúde editou as Portarias 2.048/2002 e 1.010/2012, determinando que as unidades de suporte básico sejam tripuladas por dois profissionais (um condutor de veículo de urgência e um técnico ou auxiliar de enfermagem), sendo que esse tipo de ambulância atua apenas em casos nos quais não haja previsão de intervenção médica no local ou durante o transporte. No recurso especial apresentado ao STJ, o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) questionou acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que entendeu estarem as portarias de acordo com a legislação. Decisão do médico
Segundo o relator, logo que é recebido o pedido de socorro no Samu, a decisão sobre qual tipo de transporte será enviado para atender a urgência cabe ao médico responsável, depois de avaliado o caso pela Central de Regulação Médica de Urgência – o que dependerá da gravidade da situação e do tipo de atendimento necessário.
Og Fernandes destacou que a decisão do médico pela ambulância do tipo B ou pela Unidade de Suporte Básico de Vida Terrestre só deverá acontecer quando o veículo for destinado ao transporte entre hospitais de pacientes com risco de vida conhecido e ao atendimento pré-hospitalar de pacientes com risco de vida desconhecido, não classificado com potencial de necessitar de intervenção médica no local ou durante o transporte até o serviço de destino.
"Por tal razão, esse tipo de ambulância é tripulado por, no mínimo, dois profissionais, sendo um o motorista e um o técnico ou auxiliar de enfermagem, ou seja, não se impõe a presença de enfermeiro nessa modalidade de veículo, o que não impede que o médico decida pelo envio de um enfermeiro, a depender do caso concreto, justamente por se tratar de uma tripulação mínima, conforme normatização vigente", afirmou. Mundo ideal
O ministro ressaltou que, quando se trata de atendimento a pacientes graves, com a vida em risco, ou que demandem cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica, há previsão normativa de envio de ambulância tipo D ou Unidade de Suporte Avançado de Vida Terrestre, cuja equipe é de no mínimo três profissionais, sendo um condutor do veículo, um enfermeiro e um médico.
"As Portarias 2.048/2002 e 1.010/2012, que criaram as regras descritas, não ofendem as previsões da Lei 7.498/1986, mas, sim, pelo contrário, as detalham e concretizam no plano infralegal", declarou o relator. Ao negar provimento ao recurso apresentado pelo Cofen, Og Fernandes concluiu que, "em um mundo ideal, seria interessante que cada ambulância, independentemente do tipo de atendimento que lhe cumprisse prestar, tivesse em sua tripulação enfermeiros e até mesmo médicos. Entretanto, não é essa a realidade dos fatos, especialmente no Brasil, país de conhecidas desigualdades sociais e regionais".
Fonte: Superior Tribunal de Justiça