Apesar de um aumento médio anual de 10% na demanda por exames no País, laboratórios de análises clínicas criticam falta de reajuste nos preços dos exames – tanto no SUS quanto nos planos. Caso o cenário não mude no longo prazo, empresas apontam para um risco estrutural entre pequenas e médias, agravado pela concentração do mercado de operadoras de saúde.
Mesmo com a Lei 13.003 de dezembro de 2014 que determina condições necessárias na relação contratual entre operadoras de saúde e prestadores de serviço, laboratórios afirmam que reajustes continuam abaixo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador proposto pela lei para o reajuste de contrato que mantém como prioridade a livre negociação. De acordo com os laboratórios procurados pelo DCI, a lei trouxe base legal para a discussão, mas atualmente, grande parte dos casos de reajuste terminam no judiciário.
"Precisamos de uma atualização da tabela financeira. Queremos que ao menos acompanhe o IPCA. São raras as vezes que conseguimos 100% do IPCA", coloca o diretor comercial do Laborfase Padrão de Santo André, Marcos Machado Ferreira durante o 11º Congresso Brasileiro de Gestão em Laboratórios Clínicos. E a situação, de acordo com ele, só tende a piorar com a concentração do mercado de operadoras de saúde. "Isso pode criar mais dificuldades para pequenas e até as médias que têm menor poder de negociação que uma grande, por exemplo. Essa política de sufocar é um risco para o consumidor também porque a pequena não consegue aguentar", explicou.
De acordo com o diretor do laboratório Fênix de Campinas, Antonio Carlos de Carvalho, o setor está com dificuldades de conseguir reajustes desde 1994 com o SUS; com as operadoras não é muito diferente. "[No início de 1990] a indexação ficou proibida e acabou, mas os preços ficaram parados", diz.
Como exemplo o sócio-diretor do Laboratório Padrão de Ribeirão Preto, Fernando Henriques Pinto, cita o valor dos hemogramas que há anos se encontra nos mesmos patamares, sendo R$ 4,11 na tabela SUS e entre R$ 4,50 e R$ 9 nos planos – isso em meio a um aumento de custos. "Temos reajuste da folha de pagamento e alta de insumos que variam entre 6% e 10%", diz.
Saídas
"Não sentimos que o reajuste que as operadoras conseguem seja repassado para os laboratórios", acrescenta Carvalho do laboratório Fênix. Segundo Carvalho, uma das saídas que podem ser tendência no mercado laboratorial é a busca de clínicas populares que têm conseguido atender os beneficiários que perderam seus planos de saúde, devido à crise econômica e o desemprego. "É uma boa saída para buscar usuários sem convênio", expõe.
Outra questão levantada por Ferreira do Laborfase Padrão é a busca por outros tipos de exames como o de biologia molecular, que não são cobertos por planos de saúde e têm um maior tíquete médio. "De certa forma, é um modo de fugir dos planos", indica o executivo.
De acordo com Ferreira, em meio à busca de margens melhores, o setor de laboratórios também precisa pensar em diferenciais que ajudem em um cenário mais concorrido. "Alguns exames também serão realizados em farmácias, por exemplo. Não é tudo, mas algumas demandas podem acabar indo para as farmácias", diz.
De acordo com o presidente da Federação dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo (Fehoesp), Yussif Ali Mere Jr., todo este cenário (falta de reajuste da tabela de exames e glosas) tem propiciado a consolidação do setor e coloca em risco quem não consegue escala. "O cenário faz com que seja necessário fazer cada vez mais exames para conseguir manter o laboratório aberto."
Desperdício
Outro debate levantado pelo setor são as notícias sobre desperdícios na saúde suplementar. "Vemos levantamentos que mostram que entre 30% e 50% dos exames não são retirados, mas essa informação não é verossímil no nosso segmento. O valor real é de 5%", afirma o diretor de acreditação e qualidade da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial, Wilson Shcolnik.
Segundo o executivo, sem o equilíbrio das contas do segmento, a qualidade do resultado do exame é colocado em risco. "O setor depende de investimentos em tecnologia e capacitação técnica. Sem o equilíbrio financeiro e esse investimento o paciente pode ser onerado com exames não confiáveis, o que pode trazer mais gastos em exames sendo refeitos", explica Shcolnik.
Se resolvido o problema, ele comenta que o mercado tem uma perspectiva de crescimento de demanda muito grande nos próximos anos, sobretudo por questões como o envelhecimento populacional, o investimento da população em exames preventivos e o empoderamento do paciente. "Em média a quantidade de exames cresce 10% ao ano e pode aumentar com essas tendências. O projeto Genoma possibilitou parte desse avanço, porque as pessoas conseguem identificar a predisposição para certas doenças", conclui.
Fonte: DCI