O Grupo Técnico Financeiro do SindHosp abordou, em sua última reunião, um tema sensível às instituições de saúde, em especial hospitais. A coordenadora do GT, Carolina Dantas, atual diretora de Pessoas, Controladoria e Finanças do Hospital Infantil Sabará, em São Paulo (SP), falou sobre os desafios em torno dos modelos de remuneração dos serviços de saúde. “Os gestores de instituições de saúde precisam entender como as estruturas de prestação de serviços e precificação influenciam na defesa de margens”, resumiu Carolina Dantas na abertura do evento virtual, que aconteceu no dia 15 de setembro.
Do ponto de vista financeiro, a perenidade e a longevidade do negócio dependem de um complexo equilíbrio na relação que se estabelece entre as instituições de saúde, os pacientes, as equipes assistenciais e as fontes pagadoras – que são as operadoras de planos de saúde. “Há em curso no mundo, e no Brasil, uma transição de modelos de remuneração de serviços de saúde, com foco cada vez maior no paciente, ou seja, no pagamento por desempenho. No futuro, a tendência é a de se trabalhar com uma coordenação do cuidado, privilegiando o monitoramento de desfechos clínicos e o aprimoramento da qualidade do sistema”, explicou a coordenadora do GT Financeiro do SindHosp.
Comitê de avaliação de margens
Segundo Carolina Dantas, a evolução dos modelos de remuneração depende de uma mudança cultural que influencie as áreas produtivas a pensarem a prestação de serviços sem ofender a defesa de margens necessárias para a sustentabilidade do negócio. “Por isso recomendamos que haja um comitê de avaliação de margens, com pessoas das diferentes áreas. Mas por que um comitê? Para que haja mandatos, de um a dois anos, no máximo”, recomendou Dantas.
A coordenador do GT Financeiro do SindHosp considera que o futuro da saúde depende da coordenação do cuidado, mas alerta: “Modelos de pagamento por desempenho exigem um esforço estruturado de toda cadeia de serviços de saúde, do cuidado em si até a estrutura de informações e de comunicação. Pensar a coordenação do cuidado transcende àquela unidade de saúde, passa a ser regida pelo paciente, e não pela unidade de saúde em si”. E acrescenta: “A coordenação do cuidado sendo feita de modo fluído entre todas as instituições que prestaram serviço de saúde para um determinado paciente tende a assegurar à fonte pagadora uma redução de sinistralidade importante. Além disso, à medida que nos distanciamos dos modelos mais antigos de remuneração, nos aproximando dos modelos que olham para os desfechos, ocorre uma transferência do risco de quem paga para quem presta os serviços”.
Eficiência e qualidade
A dúvida do mercado é se isso está ou não próximo de acontecer. Para Carolina Dantas, as instituições de saúde estão repensando suas estruturas de custos de modo a conciliar ganho da eficiência operacional com manutenção ou aumento da qualidade de atendimento. “Elas sabem que são necessidades indissociáveis e inegociáveis, mas quantas estão investindo na estruturação das informações e da comunicação dos dados de saúde? Este é o desafio: entender de que forma a gente viabiliza, no futuro, a coordenação do cuidado com transparência para as fontes pagadoras através da estrutura de informações e de comunicação. Temos de lembrar que as operadoras de planos de saúde estão vivendo um momento crítico com a elevação do índice de sinistralidade, e essa crise terá reflexo em toda a cadeia de custos”.
Na prática, a pergunta que fica é: as instituições de saúde brasileiras estão maduras para que possam evoluir com os modelos de remuneração voltados para desfechos clínicos, qualidade de vida, funcionalidade e assim por diante? “Maturidade significa estrutura de informações gerenciais de desempenho para que se entenda de maneira segura quais margens precisam ser defendidas para que haja perenidade da instituição. Ou seja, estrutura de informação e avaliação de desempenho. Antes de definir o preço, precisamos fazer a lição de casa e entender qual é a estrutura de captura da performance dos serviços de cada uma das verticais e, abrindo as verticais, das especialidades médicas”, sustentou Carolina Dantas. “Somente com esses dados conseguimos repensar com áreas multidisciplinares a configuração dos serviços. Mas existe uma baixa maturidade das instituições brasileiras”.
Os principais modelos
Fee for service – Modelo mais tradicional, que se mostra cada vez mais ineficiente se utilizado de maneira isolada. O pagamento acontece de acordo com a quantidade de procedimentos e recursos usados.
Por diangóstico, ou DRG (Diagnosis Related Groups) – Regido pela classificação do CID (Código Internacional de Doenças). O pagamento ocorre por pagamento fixo baseados nos códigos CID-10. O modelo tem foco na doença em vez da prevenção e/ou internações evitáveis. Desconsidera o ciclo completo do cuidado à saúde. Tornou-se ultrapassado, pois está ancorado na doença.
Capitation – Objetiva resolver o problema dos altos gastos e o aumento da sinistralidade das operadoras. A ideia central está na previsibilidade. A remuneração é calculada por valor fixo para um grupo de vidas de determinado serviço. Não considera eventuais complicações ou desfechos clínicos. Não tem forte aplicação no sistema brasileiro, pois traz muitos desequilíbrios para o prestador de serviço.
Orçamento global – É fortemente praticado. Os valores são pré-estabelecidos e fixos para a prestação de serviço. Há um grande desafio de lidar com variáveis de risco, como a ineficiência no cuidado do paciente. Há um ganha-ganha entre operadora e prestador de serviço. Diárias globais são interessantes para ambos, mas o prestador de serviço de saúde precisa fazer sua lição de casa, no que diz respeito à apuração da margem dos serviços prestados.
Bundled service – Modelo mais atual, pratica o pagamento por performance, utilizando o desempenho profissional na medição. Os bundles, ou pacotes, podem ser criados segundo os serviços ou condições clínicas, o que permite estudo de realidades diferentes, considerando que o mesmo diagnóstico tem pacientes que necessitam de serviços diferentes.
Baseado em valor – Considerado o modelo mais evoluído, com o melhor de cada um dos outros modelos. Seu foco está no paciente como o centro dos serviços, o que motiva o alcance de uma boa experiência na jornada de saúde, considera a qualidade e a eficiência. O cálculo da remuneração utiliza resultados que importam ao paciente, como os desfechos clínicos e os custos relacionados. Fomenta nas instituições de serviços uma constante atualização e evolução de sua qualidade de nível de serviços, motivando as instituições a trabalharem em busca de eficiência operacional, fazendo mais com o mesmo, mantendo ou aumentando a qualidade.