Placenta no início da gravidez é mais sensível à zika

Células da placenta possuem receptores que facilitam a entrada do vírus

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A placenta das gestantes com até três meses de gestação é até 30 vezes mais sensível à infecção pelo vírus zika do que no fim da gravidez, revela estudo do Instituto de Química (IQ) da USP e do Instituto Butantan em parceria com a Universidade de Missouri (Estados Unidos). A pesquisa utilizou células-tronco para reproduzir as células da placenta jovem e identificou genes de quatro receptores virais, que favorecem a entrada do vírus. A placenta jovem também não possui interleucinas, moléculas de defesa contra vírus. O estudo, descrito em artigo da revista PNAS, ajudará no desenvolvimento de marcadores genéticos de propensão da infecção em gestantes e no desenvolvimento de testes para um soro protetor contra o vírus.

Quando a gestante é infectada pelo zika, há o risco do vírus passar pela placenta e chegar ao feto, podendo provocar microcefalia. “A placenta a termo, a qual se tem acesso no nascimento, oferece uma boa proteção contra a infecção pelo zika”, diz o professor Sérgio Verjovski-Almeida, do IQ, um dos autores do artigo e pesquisador do Instituto Butantan. “A placenta jovem ou primitiva, dos primeiros três meses de gestação, é mais difícil de ser obtida. O estudo verificou se essa placenta tende a ser mais infectada e quais as bases moleculares dessa diferença.”

Para conseguir amostras das células da placenta jovem, conhecidas como trofoblastos primitivos, foi utilizado um modelo de células-tronco desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Missouri. “Esse método utiliza células-tronco embrionárias, que são reprogramadas e diferenciadas para formarem trofoblastos”, relata Verjovski-Almeida. “Os genes funcionais dessas células foram comparados com os da placenta a termo.”

A análise realizada pelo doutorando Dinar Yunusov, do IQ, identificou na placenta jovem genes que expressam grandes quantidades de quatro receptores virais, aos quais os vírus se ligam quando atacam as células. “Esses receptores não existem na placenta a termo, por isso ela é mais difícil de penetrar”, destaca o professor. Os trofoblastos primitivos não expressam receptores de interleucinas e as próprias interleucinas, moléculas responsáveis pela defesa da célula contra vírus. “O teste de infectibilidade mostra que a placenta jovem é 10 a 30 vezes mais permeável ao vírus zika.”

Multiplicação

O estudo também verificou que a velocidade de multiplicação do vírus da linhagem brasileira do zika é menor do que a da cepa original, identificada em Uganda, na África. “Tanto a cepa brasileira, derivada da asiática, quanto a africana invadem mais a placenta primitiva, aproveitando a falta de defesa contra vírus”, aponta o professor. “No entanto, a linhagem africana multiplica-se mais rapidamente, o que destrói as células da placenta e acaba com a gestação. Esta é uma evidência importante para entender a evolução do vírus.”

Na próxima etapa da pesquisa, serão utilizadas células reprogramadas do sangue de bebês com e sem microcefalia. “As células-tronco servirão para obter os trofoblastos e reconstituir a placenta primitiva dos bebês”, descreve Verjovski-Almeida. “Nessa placenta mimetizada vão ser verificados a presença e o nível de expressão dos receptores de vírus e a diferença entre bebês.” 

O experimento será realizado com um grupo de bebês gêmeos, em que um deles tem microcefalia e o outro não é portador da doença. “A ideia é tentar estabelecer uma relação entre a ocorrência ou não de microcefalia e a presença dos receptores”, aponta o professor. “Isto identificaria genes que serviriam de marcadores da facilidade de infecção pelo zika nas primeiras semanas de gestação.” O estudo terá apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

O modelo de estudo utilizado na pesquisa irá ajudar o Instituto Butantan a desenvolver um teste para avaliar a eficácia de um soro protetor contra o vírus zika. “Por meio das células-tronco reprogramadas, será possível fazer um painel de trofoblastos primitivos, diferenciando os trofoblastos de pessoas mais e menos suscetíveis a infecção”, afirma Verjovski-Almeida. “A identificação da variabilidade permitirá fazer prognósticos sobre a multiplicação do vírus e direcionar os testes com o soro.”

Mais informações podem ser obtidas com o professor Sérgio Verjovski-Almeida no e-mail verjo@iq.usp.br

 

Fonte: Jornal da USP

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